terça-feira, 24 de novembro de 2009

Sobre monstros e monstros



Poizé. Alyne casou e mudou-se, o Phillip deu um tempo na Linden Lab e foi cuidar da vida (real), e eu, Lucrecia Slade, jornalista e produtora de estilo (nunca de moda, pq moda é pra quem não sabe se vestir e segue a manada acéfala), fui pra um lugar chamado Ethergia. Ethergia é um mundo onde incontáveis séculos de abuso de poder e magia o transformaram num continente de horror, de monstros e sobreviventes de guerras por poder político.

Peraí, Lucrecia enlouqueceu? Não, na verdade trata-se de um game MMORPG chamado Requiem: Memento Mori, que atualmente jogo na companhia de Weber Yiyuan, meu marido em Second Life. Mas o que diabos estou fazendo lá, me digam????

Na verdade, cansei um pouco do SL. Mais verdade ainda, cansei dos dramas sem sentido do SL, das pessoas sem sentido do SL, das políticas sem sentido da Linden Lab. Da falta de respeito, da falta de classe, da falta de inteligência, HUMOR e cultura. Em resumo: da falta de estilo. E estes poucos meses matando monstrinhos e que tais me deram um distanciamento perfeito para ter um olhar mais claro sobre o Second Life  e suas implicações como mundo virtual.

Não vamos discorrer sobre as diferenças óbvias do SL em relação aos massive multiplayer online games, mas vamos tocar em algumas dessas diferenças pra ver como a Linden é de uma burrice e incompetência administrativas das mais rasteiras -- coisa que os outros mundos virtuais como World of Warcraft, Eve, Star Wars Online, LOTR Online e por aí vai, sofrem pouco em comparação.

Em primeiro lugar, é um game. Sim, isso significa regras, limitações, vantagens, poderes, metas, prêmios e lados muito bem definidos -- eu sou uma heroína (uma elfa nanica com grandes poderes de magia e zero muque e que com meia bifa na cara cai dura, com a boca cheia de formiga). Nasci no CU do mundo e tenho de evoluir mais e mais para, na batalha final, vencer os poderes do mal. No meio do caminho ganho dinheiro virtual executando missões e matando criaturas malignas que assolam o mundo e ameaçam inocentes civis.

Lindo não? Mas é simples, assustadoramente simples. E todas as regras estão na sua cara, só não vê quem é burro ou cego. Num game online vc:

-- não vai comprar um terreno (até pq vc é um guerreiro, vai comprar terreno pra q?) e depois descobrir que vai pagar uma tyer gigante (pq isso não estava muito bem claro no termo de serviço que vc aceitou), 

-- não vai vender uma armadura achada no campo de batalha e pensar que não vai pagar comissão pelo serviço de venda, pois quando a janela de 'manage your items' abre, está lá a indicação de quanto vc vai pagar e o valor NÃO É abusivo;

-- não vai pagar por uma conta premium (de duração no máximo de 3 meses renováveis ou não) sem que seus dados REAIS não sejam conferidos com a empresa de cartão de crédito, ou seja, vc é vc de verdade, é chamado pelo seu nome real, recebe e-mails da empresa de games e é respeitadíssimo como cliente por isso;

-- não vai pagar por itens e serviços premium sem ser muito bem esclarecido quanto vai gastar e quanto tempo vai durar o seu uso, pois os servidores têm capacidade finita e o lag deve ser mantido sob o mais férreo e severo controle -- ou seja, você sempre tem noção de que não vai ter os itens pra sempre.

-- não vai hiperlotar o seu inventário com inutilidades, pois a cada level que sobe, alguns itens perdem magia e vc se desfaz deles ou vendendo ou passando de graça para players de ranking inferior ao seu -- menos lag, servidores limitados, lembre! Afinal, vc tem de ter grana no bolso pras armaduras de batalha, mais caras e totally über power!

-- não vai abrir um ticket e ficar implorando pelo amor de Deus pra ser respondido quando puder, pois a resposta vem em menos de duas horas DA CORÉIA DO SUL (atenção, fuso horário de DOZE HORAS) e num inglês perfeito e muito gentil, sem perder a objetividade empresarial!

-- não vai ter ilusões, pois seu novo universo é povoado de moleques com média de 17 anos de idade, que jogam absurdamente bem e que quando vêem que vc é legal, adoram ficar ensinando pra vc os truques mais cretinos do jogo (afinal, eu sou a "tia" legal e super noob que  eles curtem e qualquer pessoa acima de 24 anos é considerado "tio/tia");

-- não vai ver dramas idiotas de quem comeu quem, quem chifrou quem ou quem roubou a idéia de quem, pois ali sua habilidade de fazer alianças, amigos e participar de grupos maiores (as Guildas de Guerra) é o que vai determinar sua sobrevivencia ou não. Tem os individualistas babacas? Tem, mas quando chegam no top ranking são obrigados a fazer alianças, senão não vão pra frente;

-- não vai ter ninguém te enchendo o saco pq vc matou esse alguém há 15 minutos atrás no campo de batalha, pois lá o bicho pega geral e é cada um por si -- depois vcs podem bater papo sobre vários assuntos maneiros pelo chat e ninguém vai abrir um blog pra ficar choramingando pitangas virtuais ou dando ataquinhos de pelanca sobre o quanto vc foi escrota em jogar ácido sulfurico na fuça dele justo quando ele estava pra vencer o embate.
(Mas que foi legal, foi! )  XD

-- Uma atualização: caso o player seja apanhado utilizando hacker (que é como eles chamam os programas piratas que "quebram as regras" e fazem com que o jogador evolua mais rápido do que o normal) não tem discussão, nem ticket, nem JIRA, nem porra nenhuma -- é sumariamente EXPULSO por IP, com o número registrado pra sempre e, se a empresa tiver mais de um jogo, o acesso para TODOS os jogos daquela empresa é completamente bloqueado. O jogador pode utilizar outra máquina, mas vai ter de recomeçar do zero absoluto pois a conta é sumariamente deletada, não tem shoyu, nem vela. E isso está clarérrimo nos Termos de Serviço.

Tem problemas de pessoas com pessoas? Tem, a maioria dos estrangeiros continua detestando os jogadores brasileiros, mas desta vez não por pirataria, mas jogarem bem X-D. Tem muita molecada sem noção, muito nerd sem noção, mas a coisa fica por aí. Saiu do jogo, ninguém leva ressentimento, pois é só um jogo.

E mais: eles estão na idade dos dramas, do exagero, da falta abosluta de noção, são adolescentes e saudavelmente se portam como tal. Não são como certas pessoas no Second Life, de qualquer nacionalidade, que são  o que chamo de "adolescentes com prazo de validade vencido" -- um bando de burros velhos se comportando de modo imaturo, fora de hora e, pior, sem o menor motivo concreto.

Pensando bem, os moleques de 17 anos têm alguma coisa a ensinar aos adultos, tão cheios de si e de suas pequenas frustrações do dia-a-dia. Nem tudo é pra levar pra fora do computador quando ele desliga. Pra essa turma ultra jovem e totalmente despreocupada, real life É real life e virtualidade É virtualidade.

E fim de papo.

Um comentário:

anthropological-blues disse...

Excelente análise, Lucrecia. Lamento muito a ausência de vocês, bem como de outras pessoas queridas, inteligentes, cultas e sensíveis, especialmente interessadas em discutir as experiências e as implicações dos mundos virtuais. Tudo o que vc escreveu faz mto sentido para minha investigação lá no SL. Assim, permita-me "bater uma bola" contigo no meu blog. Acho que vale a pena dialogar com algumas questões levantadas por você neste post. Aguarde!